* por Gilvan Ribeiro, Atleta Olímpico Rio 2016 e acadêmico de Psicologia e Jornalismo
O primeiro bebê que eu peguei no colo em toda a minha vida foi a minha própria filha. Se você já se viu tomado por uma mistura de encantamento e desespero ao mesmo tempo, vai entender do que estou falando. Além de questões práticas sobre como eu devia segurar nas mãos aquele ser tão belo e frágil, logo me vi diante de um questionamento substancial. Bem, na verdade, a minha urgência era responder algo que me acompanhava desde quando eu descobri que seria pai. Aqui vale uma dica importante. Desconfie das perguntas que aparentemente são simples, pois é justamente nelas que se escondem as respostas mais complexas. Podemos colocar em prova essa teoria ao tentarmos encontrar solução para questões como: "O que é a vida?" ou "qual é a fórmula da felicidade?". Da mesma forma, quando eu tentei responder "o que é ser um pai?'', me vi diante de um oceano totalmente desconhecido.
Ao refletir sobre "o que não é ser pai" e olhando para a nossa cultura, percebi que era mais fácil encontrar modelos a não seguir. Sabemos que diante de um desafio como este, muitos homens infelizmente se eximem de sua responsabilidade e se afastam, causando uma lacuna que pode ser irreparável no futuro das crianças. Um dado emitido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com base no Censo Escolar de 2011, mostra que no Brasil cerca 5,5 milhões de crianças não possuem o nome do pai na certidão de nascimento. Esse número alarmante é resultado, sem dúvidas, de uma construção cultural que precisa ser revista.
Os motivos pelos quais alguém decide "não ser pai" não cabe a mim julgar. Eu não posso também falar sobre a experiência daqueles que optam por não assumir a presença paterna. Apenas o que posso dizer é que as suas filhas e filhos estão perdendo muito sem vocês, e que vocês perdem de viver a experiência mais transformadora que um homem pode experimentar. Cabe observar que registrar uma criança e garantir-lhe subsídios financeiros também está longe de ser o suficiente. Diferente de outras questões em que você pode deixar de lado na vida sem maiores consequências, até que esteja preparado para lidar com elas, a paternidade não tem "pausa'' e não pode ser terceirizada. Enquanto você busca elaborar os seus conflitos existenciais, sua filha (ou filho) está crescendo e demandando amor, atenção e todos os cuidados básicos relacionados à integridade da vida humana. Mas afinal, o que é ser pai?
Entendo que ser pai é, antes de mais nada, estar presente de forma incondicional. É uma entrega que ocorre literalmente de corpo e alma. A partir disso, vi que o mais prudente a ser feito era abandonar esta pergunta. Simplesmente porque ela poderia me levar a um manual genérico, com respostas encapsuladas que não serviriam para explicar uma experiência tão particular. Assim, me dei conta de que o mais importante era responder, para mim mesmo, "quando que nasce um pai?". Percebi, então, que este pai já havia nascido, antes de eu pegar a minha filha no colo pela primeira vez. Mesmo que de forma incipiente, cheio de medo, eu já estava deixando de ser filho e me tornando um pai. Havia uma construção desajustada, mas repleta de amor, que buscava dar conta de mapear um caminho para a paternidade que surgia dentro de mim.
Logo entendi que o nascimento de um pai ocorre quando você está disposto e permite que esse pai surja em você. As dúvidas e o medo de não estar fazendo o seu melhor sempre estarão presentes. A questão é se você está disposto a lidar com isso ou não. Se estiver, garanto-lhe que irá navegar no mais lindo dos oceanos.
Assim me vejo diante de cada sorriso da Clara, que ressoa em mim como uma paisagem que de tão bela se torna inexplicável. Nasce um pai quando nasce uma criança diante de nós, mas principalmente quando deixamos renascer a criança que estava adormecida dentro de nós. É um caminho encantador e sem volta, em que podemos aprender e ensinar algo novo a cada dia.